"Nós, de uma olhadela, percebemos três copos em cima de uma mesa; Funes, todos os rebentos e cachos e frutos que comporta uma parreira. Sabia as formas das nuvens austrais do amanhecer do trinta de abril de mil oitocentos e oitenta e dois e podia compará-las na lembrança com as listras de um livro espanhol encadernado que vira somente uma vez e com as linhas da espuma que um remo sulcou no rio Negro na véspera da batalha do Quebracho. Essas lembranças não eram simples; cada imagem visual estava ligada às sensações musculares, térmicas etc. Podia reconstruir todos os sonhos, todos os entressonhos. Duas ou três vezes havia reconstruído um dia inteiro; nunca havia duvidado, cada reconstrução, porém, tinha requerido um dia inteiro."
Jorge Luis Borges, "Funes, o Memorioso", in Ficções, trad. Carlos Nejar, São Paulo, ed. Globo, 1995, p. 114.
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