“Língua:
Devemos ser
gratos ao portugueses. Se não fossem eles estaríamos até hoje falando
tupi-guarani, uma língua que não entendemos.
O ‘Pois sim’
e o ‘Pois não’ deveriam ser estudados em profundidade pelos nossos políticos
devido à louvável peculiaridade de significarem exatamente o contrário do que
dizem. Ou não.
O homem é o
único animal que possui o génio da palavra. Quanto a nós, brasileiros, também
nisso perdemos o bonde. Não falamos nem a língua de Dante, nem a de Goethe, nem
a de Shakespeare. E cada vez falamos pior a de Camões.
Quando os
eruditos descobriram a língua, ela já estava completamente pronta pelo povo. Os
eruditos tiveram apenas de proibir o povo de falar errado.
Só existe
uma língua, a falada.
Estão usando
a língua como sempre. Mas cada vez usam menos o idioma.
Eu falo
italiano melhor do que escrevo inglês. Leio francês melhor do que entendo
alemão. Traduzo espanhol melhor do que falo inglês. Escrevo português melhor do
que leio italiano. O que, tudo junto, dá a medida de minha ignorância.
Que língua,
a nossa! A palavra oxítona é proparoxítona.
O que os olhos
não vêem a língua inventa.”
Millôr
Fernandes, “Língua”, in Millôr
Definitivo: a Bíblia do Caos, São Paulo, LPM, 1994, p. 284-285.
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