“Já que usei a expressão “antiga como o tempo” [as old as time], devo citar outro verso (…). (…) Achei-o citado por Kipling num livro seu não muito memorável, chamado From sea to sea: “A rose-red city, half as old as Time” [Uma cidade rubro-rósea, com a metade da idade do tempo]. Tivesse o poeta escrito “A rose-red city, as old as Time”, não teria escrito absolutamente nada. Mas “half as old as Time” empresta uma espécie de precisão mágica — a mesma espécie de precisão mágica obtida por aquela estranha e corriqueira expressão inglesa “I will love you forever and a day”. “Para sempre” significa “por um tempo muito longo”, mas é abstrato demais para empolgar a imaginação.
Temos a mesma espécie de truque (…) no título daquele livro famoso, as Mil e uma noites. Pois “as mil noites” significam para a imaginação “as muitas noites”, tal como “quarenta” costumava significar “muitos” no século XVII. “When forty winters shall besiege thy brow” [Quando quarenta invernos assediaram teu semblante], escreve Shakespeare; e penso na trivial expressão inglesa “forty winks” exprimindo “uma soneca”. Pois “quarenta” significa “muitos”. E temos aqui as “mil e uma noites” — tal como “a rose-red city” e a fabulosa precisão de “half as old as Time”, que fazem o tempo, é claro, parecer ainda mais longo.”
Jorge Luis Borges, “A metáfora”, in Esse ofício do verso, org. Calin-Andrei Mihailescu, trad. José Marcos Macedo, São Paulo, Companhia das Letras, 2000, p. 44-45.
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